Acorrente sua bike aqui, invisível! #cicloolhar
Andréia Queiroz, ciclista de meia-idade, trabalha como cozinheira, em um pequeno restaurante no mercado velho, pedala há mais de 5 anos, sempre para transitar de onde mora, no bairro Mandacaru, para o trabalho, na Praça da Bandeira, zona central de Jequié, cidade com mais de 158 mil habitantes, no interior da Bahia.
A ciclista trabalhadora, relata que ao chegar no destino de labuta, ela e colegas de ofício, costumam acorrentar suas bicicletas, em um dos postes de madeira que sustenta uma cobertura de ponto para táxi, em uma das entradas do mercado velho. Andréia, afirma, que ela e colegas, enfrentaram resistência de alguns taxistas do local, que não queriam bicicletas acorrentadas no espaço, mesmo sem as bicicletas estarem causando dificuldade para o estacionamento dos táxis.
“Um dos taxistas fez várias tentativas de tirar a gente do local, chamou até o guarda, que disse: não posso fazer nada. Fomos ficando e ouvindo provocações, acorrentamos nossas bicicletas ali porque estão próximas do nosso local de trabalho, é seguro com sombra”, descreve Andréia.
A Praça da Bandeira é o coração comercial da cidade, onde não existe bicicletário público e seguro ou basicamente paraciclos, local do Terminal de Transporte Coletivo Adalberto Moreira Nascimento, revitalizado pela administração municipal, com valor total de R$ 2.604.042,46 (dois milhões, seiscentos e quatro mil, quarenta e dois reais e quarenta e seis centavos), segundo informações da Prefeitura de Jequié.
O relato da resistente mulher e operária ciclista, traduz aquilo que, infelizmente, está materializado de uma forma muito sólida nas experiências vivenciadas pela cozinheira, no ponto para táxi e também na revitalização do terminal, ambos têm raízes estruturais na forma de entender a bicicleta e suas infinitas possibilidades e diversidade. Ciclistas que enfrentam preconceitos por usarem a bicicleta como um modal, além da ausência de políticas públicas pró-bicicleta, trânsito hostil, e o sentimento real de sentir na pele, a cada pedal, de serem tratados como invisíveis.

Para que mais pessoas usem bicicletas no Brasil, é preciso que os municípios brasileiros, por meio de políticas públicas, ofereçam pelo menos, o mínimo de estrutura ciclística, construída com participação popular de verdade, escutando especialmente, os que andam de bicicleta, para implementar com qualidade, segurança e eficácia, ciclovias, ciclofaixas, bicicletários e paraciclos, respeitando o jeito local de pedalar e a diversidade do nosso povo.
A Lei Federal nº 14.729, sancionada em novembro de 2023, incentiva o uso de bicicletas como meio de transporte e promove a participação popular no processo de implantação de infraestruturas destinadas à circulação de bicicletas e determina orientações aos municípios.
A UCB (União de Ciclistas Brasileiros) orienta, que os municípios do Brasil, precisam de mais e melhores estacionamentos para bicicletas, disponibilizando gratuitamente no site da entidade, um guia de boas práticas para instalação de estacionamentos de bicicletas: paraciclos e bicicletários em espaços públicos e privados.
No Recife, capital do estado de Pernambuco, um exemplo simples e concreto de política para o bem comum, desde junho de 2024, a prefeitura possibilita que através do aplicativo Conecta Recife e pelo site da CTTU (Autarquia de Trânsito e Transporte, Polícia de Trânsito), ciclistas podem solicitar instalação de paraciclos para bicicletas no município.
“Os paraciclos são primordiais para auxiliar ciclistas em áreas de grande interesse público, como parques, praças, supermercados e escolas. Implantá-los é uma maneira de fortalecer a malha cicloviária da cidade e mostrar ao ciclista que ele é bem-vindo naquele espaço”, sustenta Antônio Henrique, então gerente de Mobilidade Humana da CTTU.
Muitas praças de Jequié foram ou serão revitalizadas ou reconstruídas, a prefeitura ganhou uma nova sede e outras obras públicas estão em andamento ou foram prometidas, lamentavelmente, sem bicicletários ou simples paraciclos.
Para quem fez da bicicleta, de modo inesperado, um monumento para fotos, em uma das principais avenidas da cidade, podemos afirmar, pelo que testemunhamos como cidadão e ciclista, temos quase nada do ponto de vista ciclístico, mesmo sendo visível, muitos/as, aqueles/las que andam de bicicleta cotidianamente por necessidade ou lazer e acorrentam suas bicicletas ao deus-dará. Como nos ensina a sabedoria popular: “são os burros sendo colocados na frente da carroça”.
Temos uma foto(grafia) real, sem filtros de redes sociais, da demagogia e do preconceito dos gabinetes do poder, da omissão dos supostos coletivos de ciclismo, dos políticos e legisladores locais. É a foto revelada, daquilo que se repete silenciosamente em muitos municípios brasileiros.
Link do vídeo minuto: https://youtube.com/shorts/5nTHGTsW6zw?si=n-PnzhnJdFrIjRP6
Exija bicicletários públicos e seguros na cidade onde você pedala.
Dado Galvão é ciclista e documentarista, idealizador do Movimento Ciclo-olhar, abril/2025ativista Jil Bike.