Pedal pela Ribeira
Voltar à Ribeira é como abrir um baú de memórias da infância. Eu, que cresci frequentando esse bairro tão cheio de alma, quis revisitar suas ruas, seu cais, sua gente — e, claro, seu mar. Porque, apesar de todas as mudanças, há algo que permanece imutável na Ribeira: a paisagem serena da Baía de Todos-os-Santos.

Essa travessia de lembranças e redescobertas, desta vez sobre duas rodas, foi também uma forma de sentir o bairro com outro ritmo, mais atento aos detalhes, aos cheiros, aos sabores e às histórias que continuam pulsando por ali. Pedalar pela Ribeira foi, acima de tudo, reconectar passado e presente em um cenário que, apesar do tempo, nunca deixou de ser casa.

Nossa aventura começou no Atelier de Prentice, localizado em um casarão do século XIX, que pertenceu a uma das filhas de Francisco Amado da Silva Bahia, tradicional figura da sociedade baiana. O artista, que tem mais de 80 anos de idade, é conhecido por pintar tradições populares em azulejos coloridos, mantém vivo ali um pedaço da história baiana. Além das obras, o casarão por si só já é um espetáculo: pé-direito alto, portas antigas e uma atmosfera que mistura arte e memória.

De lá, pedalamos poucos metros até o majestoso Solar Amado Bahia, hoje lar do Museu do Sorvete. O prédio, com 114 anos, foi inteiramente restaurado pela Sorvetes Real, respeitando suas características arquitetônicas originais — como as paredes em escaiola (pintura que imita mármore) e os traços do estilo eclético. O museu oferece uma experiência deliciosa e interativa: da história da fabricação de sorvetes na Bahia a espaços lúdicos para crianças, além de uma sorveteria irresistível, uma lojinha conceito e um espaço para eventos. Uma parada perfeita para refrescar o passeio!

Seguimos, então, para o antigo Hidroporto da Ribeira, marco importante da aviação brasileira. Funcionando desde os anos 1930, foi ponto de amerissagem de aviões civis e militares. Getúlio Vargas e outras autoridades pousaram ali, diretamente nas águas da Baía de Todos-os-Santos. O espaço embora abandonado aponta vestigios dessa época, e contemplar o mar dali, imaginando o movimento dos antigos hidroaviões, é uma viagem no tempo.

Pouco adiante, chegamos ao Terminal Hidroviário da Ribeira, que conecta a Ribeira ao Terminal de Plataforma. Aqui vai uma dica que não deu pra fazer mas ficou na lista: embarcar com as bicicletas e navegar pela baía, sentindo a brisa e apreciando Salvador de uma perspectiva diferente. A dica é fazer a ida e volta para prolongar a experiência e, quem sabe, tirar belas fotos.

Ainda na Ribeira, claro que não poderia faltar uma parada estratégica na famosa Sorveteria da Ribeira. Um verdadeiro patrimônio afetivo da cidade, com seus sabores artesanais que atravessam gerações — como o icônico sorvete de tapioca e o de graviola.
Continuando pela orla, uma parada especial: a Igreja Nossa Senhora da Penha de França. Se estiver aberta, vale muito a visita. Pequena, acolhedora e com uma vista encantadora para o mar, a igreja é um refúgio de paz e história no coração da Ribeira.

Antes do almoço, uma última descoberta: o Mercado Ayô, (se estiver funcionando) é um espaço vibrante que reúne artesanato, gastronomia local e música. Vale a parada para sentir a energia da comunidade e talvez levar um pouco da Ribeira no alforje.
Com as energias renovadas, seguimos para a praia, onde fizemos uma pausa para almoço no Restaurante Veleiro. À beira-mar, saboreamos uma moqueca deliciosa, enquanto o cenário nos brindava com barcos de pesca coloridos balançando suavemente nas águas.

Para quem quiser esticar ainda mais o passeio, a dica é pedalar até Boa Viagem. O trajeto pela orla é tranquilo, passando por uma comunidade ribeirinha onde apenas pedestres e bicicletas têm vez, um trecho encantador, de contato puro com a cultura popular e a natureza.
Este pedal pela Ribeira é a prova de que Salvador vai muito além de suas praias famosas. Aqui, cada rua, casarão e pedaço de mar guarda histórias que se revelam para quem sabe pedalar com olhos atentos e alma aberta.

Dicas para aproveitar melhor o passeio:
Bicicleta ideal:
Prefira uma bicicleta de alumínio — mais leve e resistente à maresia, ideal para regiões litorâneas como a Ribeira. Antes do passeio, revise os pneus, ajuste o câmbio e lubrifique a corrente. Se puder, opte por pneus mais largos, que dão mais conforto no piso irregular das ruas antigas.
Onde se hospedar:
Para curtir ainda mais o bairro, a dica é se hospedar na charmosa pousada Bela Vista da Ribeira (veja aqui). De frente para o mar, é o lugar perfeito para relaxar depois de um dia pedalando — e ainda aproveitar o pôr do sol inesquecível da península.
Travessia de barco:
Não deixe de fazer a travessia de barco entre Ribeira e Plataforma levando a bicicleta. Além de prático, é um passeio que conecta história, natureza e aventura numa única experiência.

O que levar:
- Garrafinha de água
- Protetor solar
- Boné ou viseira
- Trava para bicicleta
- Roupas leves e confortáveis
Melhor horário para pedalar:
Comece cedo, aproveitando o frescor da manhã e a luz dourada do amanhecer para fotos incríveis.
Dica extra: Se sonha em velejar indico também a escola Baia Vela e Mar, que proporciona a experiência de conduzir um veleiro, pela Baia de Todos os Santos.